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Propósito do estudo dos pré-socráticos na tarefa 101:00

Rubi Rodrigues - 06/07/2022

PROPÓSITO DO ESTUDO DOS PRÉ-SOCRÁTICOS NA TAREFA 101:00

O estudo das ideias e das circunstâncias dos pensadores pré-socráticos, na primeira fase dos estudos da Academia, tem como objetivo principal revelar ao aluno o “espírito do tempo”, que caracterizava o grego clássico presente no berçário da filosofia ocidental. Trata-se menos de dominar os conceitos emergentes, que tentavam traduzir, racionalmente, verossímeis teses da criação, descritas alegoricamente nos mitos, e mais de mergulhar na cultura mitológica, sentir e experimentar o vigor e a nobreza de espírito, que a convivência diária com os deuses propiciava. Diz-se que não iniciavam novo empreendimento sem antes invocar a proteção dos deuses. Esses deuses não tinham, então, a conotação “divina” introduzida pelo cristianismo, mas indicavam, sobretudo, as forças cósmicas criadoras que sustentavam e geriam o universo, das quais os homens, realisticamente, sentiam-se tributários. Essa convivência diária com os deuses propiciava, portanto, muito mais do que apenas ser um ator ligado, atento às circunstâncias e ao meio, como um inquisidor arguto, interessado nas propriedades divinas, para bem armar-se para o exercício da vida.

Em tempos modernos, podemos traduzir a conexão dos antigos para com os deuses no sentido de profunda conexão para com a natureza, ainda hoje, ocasionalmente, presente no homem do campo – conexão com a natureza, que se eclipsou no homem moderno, virtualmente, em razão da vida na cidade e do seu cultivo da racionalidade, eventos que não mudam o fato de o homem ser também fruto da natureza e estar igualmente sujeito às leis cósmicas que a regem.

Desse modo, este estudo visa a recuperar a consciência da nossa relação estrutural com a natureza e com as leis universais que a regem, tendo em vista que apenas um ser humano plenamente integrado e harmonizado com a natureza, que tanto o constitui como constitui também o mundo onde vive, pode almejar vivência e convivência harmoniosa consigo mesmo e com o mundo circundante. Apenas uma conexão íntima com as leis universais pode tornar o homem um ator sereno e, ao mesmo tempo, eficaz e eficiente no mundo.

Observe-se que designar como “deuses” as leis cósmicas regentes da natureza representa solução inteligente, que traduz, simultaneamente, a reverência e a consideração devidas por um ser consciente e harmonizado com a sua própria natureza. Naturalmente, haverá homens mais próximos dos estágios iniciais de organização da vida, aos quais seja difícil entender a que estamos, aqui, referindo-nos. No entanto, haverá também homens evoluídos que se sintam à vontade diante de deuses, sendo capazes de olhar para esses deuses e para a natureza circundante e sentirem-se em casa, livres, soberanos de si mesmos e, por que não dizer, amigos íntimos dos deuses. Esses homens evoluídos são os habilitados à convivência com estágios superiores de organização da vida, os convidados a superar a caverna de Platão.

No meu caso particular, a imersão nesse espírito grego clássico deu-se com maior intensidade após a leitura da mítica viagem da nave Argos Argonáuticas Órficas e do texto Sobre los mistérios egípcios, disponíveis nos volumes 104 e 242 da Biblioteca Clásica Gredos.

Na descrição da tarefa, está indicada bibliografia básica, mas espera-se que os nossos alunos descubram novos e promissores endereços.

 

Rubi Rodrigues

Setembro de 2021.

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