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TMC I - Módulo 07

Rubi Rodrigues - 07/06/2022

Teoria do Conhecimento I – módulo 7

No módulo 6, verificamos que a metafísica clássica justifica o advento do ser, na condição de índice indivisível de todas as coisas, e faz isso amparada por conceitos lógicos, geométricos e matemáticos, fruto da tensão do espírito grego para com as matemáticas. Nesta ocasião, vamos examinar mais profundamente os nexos lógicos que ligam essas três disciplinas à Metafísica, em tentativa de bem entender as razões daqueles pensadores originários.

Em termos geométricos, o ilimitado foi assimilado ao conceito geométrico de ponto, em razão de este ser desprovido de dimensão e não comportar limites. O uso do conceito de ponto pode ser mantido no caso, desde que o entendamos não como localizado no espaço, mas como localizado no âmbito da existência, que é onde ilimitado e limitante situam-se. Tratando-se de algo indeterminado, esse ponto precisa ser absolutamente estático, pois um movimento, qualquer que fosse, já o determinaria. Isso por si só já indica que a primeira e mais elementar determinação da geometria será produzida pela movimentação do ponto em um sentido. Ora, a figura geométrica produzida pela movimentação do ponto em um sentido é a reta ideal a qual é conhecida como figura elementar da Geometria. Sendo um ponto desprovido de espessura, o seu deslocamento representado pela reta indica apenas um sentido e, por isso, configura um âmbito de apenas uma dimensão. Por essa razão, Platão defendia que à reta correspondia o número um – ao contrário dos pitagóricos que, equivocadamente, entendiam que o número um correspondia ao ponto. Oportunamente, vamos examinar como, a partir da reta, desdobra-se o triângulo e, depois, toda a complexidade geométrica, no entanto, desde já, sabemos que as figuras nobres da geometria são os poliedros regulares e que estes culminam em um poliedro de infinitas faces, mais conhecido como esfera.

Qual é a conclusão? Uma conclusão é que a Geometria começa com um ilimitado – o ponto –, ganha determinação como unidade indivisível – a reta – e culmina também em uma unidade complexa composta de partes – a esfera. Outra conclusão é que a Geometria se revela compatível com a Metafísica, pois lança raízes em um ilimitado representado pelo ponto. Uma terceira conclusão possível é que a Geometria sanciona a ideia de que a realidade começa com uma unidade indivisível de maior simplicidade e culmina em uma totalidade fechada também unitária: a esfera.

Em termos lógicos ou de movimento, verificamos que o ilimitado geométrico – o ponto – revela-se absolutamente estático e que o primeiro movimento surge com o deslocamento do ponto e a constituição da reta, em um âmbito de uma dimensão. Ora, em um âmbito de uma dimensão, a amplitude disponível possibilita apenas um padrão de movimento o qual o próprio traçar da reta, em uma folha de papel, evidencia: o movimento começa, surge, estende-se por algum tempo e, depois, cessa, desaparece. Esse padrão de movimento – caracterizado por surgir, estender-se e desaparecer é tipicamente reconhecido como movimento transcendental. O âmbito de uma dimensão não permite mais do que isso. Quando a Geometria atinge o seu estágio máximo de complexificação, na forma de esfera, o movimento na superfície da esfera é de fechamento e ajuste das partes, de forma a constituir uma esfera perfeita fechada em unidade. No momento em que essa perfeição é atingida, o movimento de ajuste cessa, as tensões entre as partes desaparecem, posto que elas se revelam perfeitamente complementares, e a totalidade resultante, ao constituir uma unidade, entra em repouso.

Com isso, verifica-se que, assim como em Geometria, o processo de complexificação parte de uma unidade indivisível e culmina ao reestabelecer a unidade na forma da esfera, o movimento parte de uma posição estática no ponto e culmina em posição, se não estática, de repouso, no fechamento da esfera, parte de completa imobilidade e culmina em repouso também desprovido de movimento. Em complemento, vale notar que o percurso da unidade ao todo parece configurar certo ciclo no processo de complexificação, ciclo que, na natureza, repete-se no processo de complexificação.

Em termos matemáticos ou quantitativos, aceitando-se o Uno de Platão como indicativo do ilimitado que faculta a quantificação, já vimos que o ser constitui a unidade indivisível que inaugura a série dos números naturais e fornece-lhe o índice. Já vimos igualmente que a totalidade reestabelece a unidade no seio da multiplicidade. Nesse sentido, o sistema decimal mostra-se particularmente apropriado, porque a primeira dezena configura nitidamente um ciclo que vai do 1 até o 10 e replica-se, depois, em dezenas, centenas, milhares etc., na construção da complexidade quantitativa, de igual modo que a totalidade organizativa, na natureza, replica-se para construir totalidades fenomênicas mais complexas, sempre na forma de totalidade.

Esse ciclo é importante e merece reflexão futura mais detida. Aqui, por hora, concentremo-nos no fato de a Matemática também iniciar-se com um ilimitado – o uno – que potencializa tanto a unidade indivisível do ser como a totalidade unitária do que efetivamente existe em ato. Com isso, verifica-se que a Geometria, a Lógica e a Matemática não apenas fornecem a linguagem que possibilita a expressão racional da Metafísica como também constituem ciências metafísicas, porque os elementos que lhes dão origem são ilimitados que antecedem a toda realização determinada ou determinável. Em termos mais objetivos: Geometria, Lógica e Matemática, como ciências da forma, do movimento e da quantidade, possuem raízes transcendentais, tal como o ser da Metafísica.

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