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TMC I - Módulo 33

Rubi Rodrigues - 07/06/2022

Teoria do Conhecimento I – módulo 33

No módulo 32, atribuímos a Sampaio a intuição primeira de que o processo evolutivo da humanidade seguiria de par com o domínio formal de padrões lógicos crescentemente complexos que potencializam modos de pensar crescentemente poderosos, ideia perfeitamente amparada e recepcionada pelo modelo dimensional que estamos explorando.

Neste módulo, tentaremos aplicar essa concepção na consideração da história humana factual. Ora, o primeiro grande período da história conhecida é o período dos grandes impérios: Egípcio, Grego, Macedônio e, por último, o Romano. A razão predominante, nesse período, afigura-se nitidamente de padrão S1 tanto pelo absolutismo do tirano como pela forte presença de mitologias envolventes, vinculando o destino dos homens às disposições, aos favores e aos humores dos deuses. A própria criação da Igreja Católica resulta ser fruto imperial e indica também a potência com a qual o pensamento S1 de padrão transcendental predominava na época.

A queda de Roma e o fim do Império do Ocidente provocam uma diáspora que se estende em todo o território europeu, em nítido processo de fragmentação territorial e ecumênico, com a formação de pequenos feudos em evidente contraposição ao gigantismo da unidade imperial destruída. Nesse processo, o padrão S2 de pensamento, a lógica da diferença e a simetria que lhe é estrutural parecem comandar as coisas. O Príncipe e a Igreja estabelecem a dicotomia de poder que prevalece. Ocorrem, no período, tentativas de unificação, principalmente, por iniciativa da Igreja Católica, que preserva e amplia a sua ascendência espiritual, mas a resistência é grande e o próprio Império Romano Germânico do Ocidente não consegue estabelecer-se de fato e com poder efetivo. A persistência da fragmentação e a resistência à unificação apenas serão minadas e vencidas pela força unificadora e sistêmica do comércio. De sorte que, em termos gerais, parece adequado identificar a Idade Média como tributária do modo S2 de pensar.

A emersão do modo sistêmico S3 de pensar é mais nítida, uma vez que acompanha o advento da revolução industrial. A recuperação dos textos clássicos, particularmente de Aristóteles e de Platão, deflagra o Iluminismo e o Renascimento e, enfim, instala a civilização tecnológica ocidental. A revolução industrial transforma-se qualitativamente da engenharia mecânica à física quântica e à engenharia genética, espalha-se pelo globo e toma conta da vida em todos os setores. Como consequência, o modo sistêmico S3 de pensar, embalado como pensamento científico e impulsionado pelo sucesso da técnica, impõe-se com hegemonia irresistível. O pensamento científico passa a ser entendido como único pensamento confiável em razão da essencial estabilidade lógica vigente entre causa e efeito.

Nem todos concordam, porque a atenção concentrada na funcionalidade dos sistemas acabou esquecendo o homem. A reação ao descaso com o fator humano desperta o pensamento crítico de padrão S4, dito dialético ou da história. Surgem concepções comunistas e socialistas clamando por justiça social que crescem e não chegam a dominar politicamente a totalidade do mundo, mas alcançam sucesso em amplas regiões, particularmente as menos favorecidas pela civilização tecnológica, embora certas sociedades europeias também sejam seduzidas. Podemos tomar como exemplos emblemáticos de sucesso do pensamento dialético a Rússia, a China e a América Latina. As duas primeiras, por constituírem culturas mais antigas e maduras, e a América Latina, por ter cultura em sedimentação, sendo, em razão disso, palco privilegiado de confronto das vantagens tecnológicas com a persistência de miséria, em essência, dos pensamentos S4 e S3, dialético e sistêmico.

China e Rússia deram-se conta há mais tempo de que o pensamento S4 sozinho não dá conta do recado e, ostensivamente, encontraram formas de superar a dicotomia S4 – S3 e capitalizar as vantagens tecnológicas. Na América Latina, ainda predomina, em amplos segmentos, a ideia de S3 e S4 constituírem pensamentos mutuamente excludentes. A disputa política entre ideologias de esquerda e de direita evidencia isso de forma inquestionável, particularmente, no Brasil do primeiro quarto do século XXI, quando o pensamento S4 foi hegemônico durante um certo tempo, mas se diluiu velozmente, em razão das contradições que lhe são estruturais.

Voltando à perspectiva histórica, constata-se que, embora os padrões S1, S2, S3 e S4 de pensar não tenham conseguido tomar conta completa do planeta nem mesmo os impérios cobriram toda a Terra e constituíram manifestações mais ou menos localizadas, tais formas de pensar conseguem explicar e tipificar as principais fases do processo civilizatório, tanto assim que, em linhas gerais, essa classificação de fases já era adotada mesmo sem usar como critério de classificação os padrões lógicos. A classificação acadêmica já contemplava Império, Idade Média, Modernidade e Pós-Modernidade, de maneira praticamente simétrica.

Quando esse percurso e essas fases do processo civilizatório são relacionados com a estrutura do algoritmo da criação, o modelo revela todo o seu poder explicativo, mas isso fica para o próximo módulo.

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